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sábado, 6 de outubro de 2012

ORLANDO SILVA E A "AFROCONVENIÊNCIA"



Tem umas coisa que me deixam apoquentado nessas eleições: é a reviravolta de políticos profissionais como Orlando Silva.  Do ponto de vista de um militante do movimento negro que sou, fico incomodado com um aspecto específico que notei em sua campanha. Ao vê-lo do numa foto de campanha ao lado de músicos, ativistas e um cineasta negro com a inscrição acima “Tamo junto!”, percebo que ele aderiu, mesmo que timidamente, ao apelo da identidade negra. No seu plano de governo, expresso num panfleto que peguei no centro de São Paulo, Orlando é destacado como uma “liderança negra” e um representante da causa racial. Isso me incomoda: ver a causa que defendo sendo utilizada de acordo com conveniências políticas de pessoas mais comprometidas com projetos de poder individuais do que com causas sociais e coletivas. Orlando sempre foi discretíssimo sobre a questão, nunca defendeu abertamente e figurou como "incolor" em grande parte da sua carreira política. Agora, momento que tenta emergir politicamente após ter sido demitido do cargo de ministro dos esportes, utiliza como um dos motes de campanha o apelo à identidade afrodescendente como estratégia para conquistar um setor específico da população composto por ativistas e militantes da causa etnicorracial negra. Isso é o que chamo de "afroconveniência", ou seja, destacar o apelo racial para proveito particular. E é essa parte que me toca. Não falo dos escândalos em que ele se envolveu nem das suas explicações empoladas e escorregadias (creio sinceramente que ele é um mal político, pra dizer o mínimo). Falo do apelo oportunista a uma causa que sempre negligenciou e que em tempos de eleição surge no discurso como forma de “diferencial” para que se vote nele. Não se trata de discutir a negritude de Orlando, visto que esta é notória. Trata-se de fazer uso político desse fato para angariar votos. Ele poderia ser negro e não se pautar por essa questão, o que acho absolutamente justo (aliás, foi o que ele sempre fez!) O que incomoda é a pertença racial do candidato a vereador vir à tona num momento onde é conveniente se estabelecer diferenciais que “agreguem valor” ao candidato. Usar desse argumento para sensibilizar e angariar voto de militantes e pessoas sensíveis a temática negra, na minha opinião, não é correto. Não dá pra ser negro (no sentido político da palavra) só quando convém. Não adianta tirar foto com músicos, rappers e cineastas negros se sempre que a “água bateu na bunda” do movimento e se fazia importante a posição política de pessoas negras, Orlando Silva nunca foi uma opção para reivindicação, tampouco um representante da causa. Efetivamente nunca apoiou abertamente a questão política e social da(o) negra(o) e só a ressalta na tentativa que aumentar sua margem de votos frente a um eleitorado específico. Por isso divido essa reflexão com companheiros de militância e /ou sensíveis à causas. Urge o momento de elegermos pessoas realmente comprometidas com as diversas causas sociais: seja da(o) negra(o), seja da mulher, seja dos transgêneros,  etc. Apenas ressalto que não se pode votar em candidatos que negociam essas pautas em momentos eleitorais. 

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