Tem umas coisa que me deixam apoquentado
nessas eleições: é a reviravolta de políticos profissionais como Orlando
Silva. Do ponto de vista de um militante
do movimento negro que sou, fico incomodado com um aspecto específico que notei
em sua campanha. Ao vê-lo do numa foto de campanha ao lado de músicos,
ativistas e um cineasta negro com a inscrição acima “Tamo junto!”, percebo que ele aderiu, mesmo que timidamente, ao apelo da identidade negra. No seu
plano de governo, expresso num panfleto que peguei no centro de São Paulo,
Orlando é destacado como uma “liderança negra” e um representante da causa
racial. Isso me incomoda: ver a causa que defendo sendo utilizada de acordo com
conveniências políticas de pessoas mais comprometidas com projetos de poder
individuais do que com causas sociais e coletivas. Orlando sempre foi discretíssimo
sobre a questão, nunca defendeu abertamente e figurou como "incolor"
em grande parte da sua carreira política. Agora, momento que tenta emergir
politicamente após ter sido demitido do cargo de ministro dos esportes, utiliza
como um dos motes de campanha o apelo à identidade afrodescendente como
estratégia para conquistar um setor específico da população composto por
ativistas e militantes da causa etnicorracial negra. Isso é o que chamo de
"afroconveniência", ou seja, destacar o apelo racial para proveito
particular. E é essa parte que me toca. Não falo dos escândalos em que ele se
envolveu nem das suas explicações empoladas e escorregadias (creio sinceramente
que ele é um mal político, pra dizer o mínimo). Falo do apelo oportunista a uma
causa que sempre negligenciou e que em tempos de eleição surge no discurso como
forma de “diferencial” para que se vote nele. Não se trata de discutir a negritude
de Orlando, visto que esta é notória. Trata-se de fazer uso político desse fato
para angariar votos. Ele poderia ser negro e não se pautar por essa questão, o
que acho absolutamente justo (aliás, foi o que ele sempre fez!) O que incomoda
é a pertença racial do candidato a vereador vir à tona num momento onde é conveniente
se estabelecer diferenciais que “agreguem valor” ao candidato. Usar desse
argumento para sensibilizar e angariar voto de militantes e pessoas sensíveis a
temática negra, na minha opinião, não é correto. Não dá pra ser negro (no
sentido político da palavra) só quando convém. Não adianta tirar foto com músicos,
rappers e cineastas negros se sempre que a “água bateu na bunda” do movimento e
se fazia importante a posição política de pessoas negras, Orlando Silva nunca
foi uma opção para reivindicação, tampouco um representante da causa. Efetivamente
nunca apoiou abertamente a questão política e social da(o) negra(o) e só a
ressalta na tentativa que aumentar sua margem de votos frente a um eleitorado
específico. Por isso divido essa reflexão com companheiros de militância e /ou sensíveis
à causas. Urge o momento de elegermos pessoas realmente comprometidas com as
diversas causas sociais: seja da(o) negra(o), seja da mulher, seja dos transgêneros, etc. Apenas ressalto que não se pode votar em candidatos que negociam
essas pautas em momentos eleitorais.
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